A VIDA CRISTÃ E O PLANEJAMENTO FAMILIAR
Falar sobre a família é sempre um desafio, ainda mais num ambiente tão conturbado devido as inúmeras novas definições que imbuem o significado deste termo. Não é de se espantar que o mundo tente perverter o padrão criado por Deus (não queremos dizer que seja admissível), afinal de contas, o homem é um ser caído que produz uma cultura caída, levando assim todos os outros, que em sua corrupção contribuem, para a ruína da sociedade. Todavia, a situação dos cristãos em meio a tudo isso é que nos faz cair os queixos, pois, tendo a Escritura para os nortear quanto ao funcionamento da família, é até depressivo ver como temos deixado que os preceitos, costumes e cosmoviões mundanos, construam tão facilmente a percepção dos filhos da luz quanto a esse assunto que é tão importante.
Em que pese isso, precisamos nos lembrar de algo muito básico, mas que tem sido profundamente esquecido: nós não somos os mais interessados no bem-estar da família. Pode parecer uma novidade afirmar isso, mas quando olhamos para o relato bíblico, notamos que não somos os “patronos” da família, mas na verdade, esta tão sagrada instituição tem uma origem que não está em nós, mas no próprio Deus. Ele é o criador da família, foi ele quem a idealizou e quem a planejou. Como afirma Gerard van Groningen:
“A família não aconteceu simplesmente, nem apenas se desenvolveu com o tempo dentro de um contexto social. A família foi planejada. Deus a planejou; Deus a fez existir a partir de sua palavra. […] O que ele decidiu fazer, ele trouxe à existência. Como ela deveria ser formada e qual era o seu propósito foi claramente estabelecido.”
Esta informação é assaz pertinente para nossa reflexão, pois precisamos nos aprofundar na noção de que Deus é o criador da família, pois como criador, ele é o mais interessado em fazer como que sua criação seja bem-sucedida, um resultado que não poderia ser diferente, pois nada pode frustrar ou alterar os planos de Deus.
Apesar de nossa reflexão não se voltar especificamente a constituição dos elementos formadores da família, precisamos rememorar ainda que brevemente que, o nascimento da família dá-se na união de um homem e uma mulher. Ambos foram criados por Deus para um fim específico:
“[…]Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai […]”.
Encarregados de cumprir esta ordem, tanto homem quanto mulher, possuem meios de operação ou áreas de atuação diferentes, tendo como referencial o cumprimento dos mandatos cultural, social e espiritual. Os filhos são considerados pela Escritura como sendo a semente que germina no solo fértil da família, ou, a herança das promessas de Deus para a multiplicação da humanidade.
Partindo deste ponto, vamos agora levantar a tese que nos motivou a escrever este artigo: o planejamento familiar.
Sempre que ouvimos essa frase, temos a sensação de que quem as fala, está repleto de responsabilidade. Um casal de jovens deseja casar-se, e sempre que comentam sobre os planos para o futuro, a palavra planejamento aparece em 5 de 10 frases pronunciadas por ambos. A princípio, parece impossível que essa atitude esteja passível de crítica, afinal de contas, com o planejamento vem a prevenção quanto a situações que, se não previstas, podem causar incômodos ao casamento destes. Porém, é necessário questionar os pressupostos dos casais ao mencionarem suas ideias quanto ao planejamento familiar.
Há quem possa criticar nosso posicionamento, mas se observarmos a definição bíblica de casamento, veremos que Deus planejou e arquitetou o casamento para ser o lugar onde as funções de homem e mulher serão executadas, como já abordamos. Se nos voltarmos ao Texto Sagrado, notaremos que, nos planos de nosso SENHOR ao homem, está ordenado a provisão e proteção do lar e da família:
“E tomou o Senhor Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden para o lavrar e o guardar” Gn 2:15. À mulher, por sua vez, compete a tarefa de auxilia-lo em suas funções: “E disse o Senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma ajudadora idônea para ele” Gn 2.18.
Observemos que, embora o SENHOR tenha preparado todo cenário para a chegada do homem, a ordem divina não destaca condições como sendo aptas ou inaptas para o cumprimento de suas responsabilidades, e isso é percebido quando no episódio da queda, o SENHOR Deus não faz qualquer alteração com relação as diretrizes antes instituídas, muito pelo contrário, o Criador reitera a ordenança de que através do “[…] suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra” Gn 3.19. O mesmo pode ser aplicado a mulher. Com isso, percebemos que, a partir daquilo que fora criador por Deus, o homem e a mulher deveriam estabelecer a família. Não havia uma condição especial que deveria ser aguardada além daquela na qual o Senhor os introduziu.
Quando destacamos isso, estamos confrontando o pensamento de muitos jovens que pensam em se casar, ou que já estão casados com relação a diversos assuntos relacionados a família. Por exemplo, a motivação do uso de métodos contraceptivos.
Não cairemos no erro de condenar essa alternativa como sendo pecado ou coisa do gênero, porém, estamos preocupados em detectar o pensamento que está por trás do uso.
É muito comum ouvir de jovens noivos ou casados os planos de, após o casamento, esperarem um ou dois anos para terem filhos, sob a alegação de quererem “aproveitar o momento inicial do matrimônio”. Gostaríamos de refletir sobre essa posição, apontando dois argumentos. Primeiramente, como já falamos, a vinda de filhos está incluída no processo de formação da família como sendo algo natural, ou seja, embora tenhamos a possibilidade de planejar “quando e como” os filhos virão, graças aos avanços da medicina (e assim sendo, a Deus), se estamos desejando assumir o compromisso do casamento, ou já o fizemos, cedo ou tarde os filhos deverão vir, e isso deveria nos fazer adicionar todo o trabalho empenhado em cria-los de conformidade com a lei de Deus, em nossos planos de casamento. A grande pergunta é: porque não incluímos? As motivações são inúmeras, destacamos duas; (1) embora no meio cristão a ideia de casar-se não seja vista de forma pejorativa ou ruim, têm-se o hábito de idealizar que, o melhor momento para a chegada dos filhos é quando se obtiver uma condição socioeconômica interessante, e por interessante, não queremos dizer o básico ou essencial, mas sim, o confortável. Numa sociedade regada a luxos, não voltamos nossos olhos para o contentamento de sermos sustentados todos os dias pelas mãos da divina providência, mas almejamos os confortos que, embora peçam em troca um grande esforço gasto em horas de trabalho, resulte no desfrutar de privilégios. (2) Mesmo que pareçamos mais maduros e sábios do que os mundanos quanto a expectativa do casamento, ainda retemos uma ideia romantizada do casamento, onde precisamos desfrutar de todo um período “colorido” com nosso cônjuge. A fase inicial de adaptação é vista como sendo os meses ou anos áureos do casal, onde usufruirão apenas da companhia do outro, sem nada mais que interfira nesse estado “edênico”.
Em segundo lugar, se esperamos estar toda a vida ao lado de nosso cônjuge, e pensamos em passar por todos os tipos de situações que possam vir ao lado dele, por que precisaríamos aguardar algum tempo para vivermos a realidade plena (filhos) da família? Se um casal viveu 60 anos juntos (e morreram), onde 58 foram vividos com os filhos, o que poderia ter sido obtido nos dois anos iniciais que os assegurou uma alegria e satisfação tal, que supere a presença da herança do SENHOR (filhos)?
É importante alegar que, nossa observação volta-se para casais que não tenham problemas para ter filhos. Não ignoraríamos a benção do SENHOR em dar ao homem a capacidade de produzir um medicamento que possa aliviar ou corrigir algum tipo de problema no momento em que um casal planeja ter filhos, desta forma, o uso dos medicamentos ou métodos contraceptivos (sendo prescritos) é um modo de desfrutar da providência divina. Porém, quando planos pessoais como o término de um curso ou a expectativa de uma promoção no trabalho para melhoria da situação financeira entre outros, estão nos bastidores, está em voga um ideal de família que não está de acordo com a perspectiva bíblica. Para o homem, se a situação é mais fácil ou difícil, não importa, suas atribuições como provedor do lar permanecerão lá. É seu dever e obrigação sustentar a casa em todos os aspectos. Contudo, ainda ressaltamos um outro fator que muitos cristãos têm esquecido: a confiança na divina providência.
Quando mencionamos que a ideia original da família pertence a Deus, trouxemos à tona a perspectiva de que ele não somente é o arquiteto, mas o sustentador primário, a partir dele, tudo no cosmos se movimenta. O escritor da carta aos hebreus demonstra essa percepção quando alega que Cristo sustenta todas as coisas pela palavra do seu poder (Hb 1.3). A confiança do homem de que conseguirá sustentar sua casa não depende dos bons ares deste mundo convergirem para o deslocamento de nosso barco (de vento em popa), mas sim, do poder do Deus trino e uno em estabelecer tudo conforme lhe agrada, e tendo projetado a família para ser como prescreveu, ele pessoalmente se encarrega de providenciar o sustento para que o homem possa, por sua vez, sustentar sua casa.
Tendo depositado nossa confiança, integralmente, na providência do SENHOR, nós homens podemos crer que, sustentaremos nossa casa, e dessa forma, tomamos sobre nossos ombros a ferramenta do trabalho, nos esforçando para cumprir o mandamento do SENHOR.
Da mesma forma as mulheres, crendo que, da boca do SENHOR procederá o sustento de sua casa, devem dedicar-se a maior de todas as ambições: obedecer ao SENHOR Deus e servi-lo. Sua casa é o local onde sua vida ganha o maior dos propósitos, pois é lá que o Rei do Universo, Cristo Jesus, será servido por elas e glorificado.
Jamais afirmaríamos que o planejamento familiar é algo ruim, pois, devemos pensar e refletir sobre o compromisso do casamento, conforme nos orienta as Escrituras, entretanto, analisando os parâmetros bíblicos para a família, é da própria palavra de Deus que extrairemos nossa visão quanto a estruturação familiar. Fora dos planos do SENHOR para a família, o que sobra, é uma visão mundana e egocêntrica que, ainda que esteja travestida de “responsabilidade” esconde uma visão estranha ao que prega as Escrituras, além do mais, responsabilidade e conformidade com o padrão bíblico não são coisas excludentes.
Buscar traçar planos com vistas a seguir um caminho mais objetivo ou mais estável em direção ao propósito de construção de uma família não é pecado, porém, devemos ter cuidado quanto as motivações que estão por trás de nossos planos. O que queremos é de fato estabelecer uma família, ou obter conforto e o atendimento de carências pessoais? Para o primeiro há promessas de bênçãos e o derramamento das misericórdias do SENHOR, para o segundo, não. Que estejamos atentos para o que constrói nossa visão quanto aquilo que Deus planejou perfeito, para que não corrompamos o propósito divino quanto a família, e não soframos, não honrando Àquele a quem devemos obedecer e dedicar tanto nossa vida quanto nossas famílias.